Jazia no meio do cetim branco brilhante, bordejado com rendas brancas, daquelas que picam se lhes tocarmos. Quando vemos os corpos mortos, pensamos sempre em coisas que nos envergonham e que não ousamos confessar. Que não compreendemos porque falam da palidez da morte. Deve ser pela poesia. Falar da amarelez da morte não traz aquele bailado romântico das palavras e faz logo lembrar a cor das velas compridas que ladeiam os caixões.
Como será a vida a desaparecer daquele corpo? Como será o último momento de vida e primeiro momento da morte? Supomos, esperançados, que não deve doer e respiramos com mais convicção, só porque nos lembramos que respiramos. Lembramo-nos que respiramos porque estamos ali, perto de um corpo que não respira.
Reparamos nos sapatos. Estão ali numa posição de destaque que não teriam quando o corpo era vertical. Alegramo-nos por serem aqueles sapatos, por terem escolhido os mais bonitos e que ficavam melhor no pé. Lembramo-nos de como eram os pés que estão dentro dos sapatos. Os pés já estão escondidos de nós para sempre. Não, não são só os pés, já só podemos ver a cara e as mãos postas. Ao resto do corpo está-nos vedado o acesso. Começamos então a sentir no corpo a falta do corpo e a tentar relembrar as partes que faltam. Parece que nem recordamos, tanta é a força que fazemos para guardar todos os pormenores. É nessa altura, a altura em que concluímos que não conseguimos recordar a forma de todas as partes do corpo, que começamos a fazer batota e a recordar as fotografias. É sempre mais fácil pelas fotografias.
Depois pensamos se conseguiremos tocar no frio que vem daquele corpo. No frio que sentimos se tocamos num corpo morto. Um frio que fica na memória dos lábios, como ficam os cheiros no nariz. Que conseguimos invocar, trazer até nós. Tomamos coragem e balanço para dar um último beijo.
Não. Adiamos mais uma vez.
Questionamos se o corpo está mais leve assim. Se é mesmo verdade que acaba tudo. Se nos esquecemos de desligar o esquentador. Se ainda falta muito.
Como será a vida a desaparecer daquele corpo? Como será o último momento de vida e primeiro momento da morte? Supomos, esperançados, que não deve doer e respiramos com mais convicção, só porque nos lembramos que respiramos. Lembramo-nos que respiramos porque estamos ali, perto de um corpo que não respira.
Reparamos nos sapatos. Estão ali numa posição de destaque que não teriam quando o corpo era vertical. Alegramo-nos por serem aqueles sapatos, por terem escolhido os mais bonitos e que ficavam melhor no pé. Lembramo-nos de como eram os pés que estão dentro dos sapatos. Os pés já estão escondidos de nós para sempre. Não, não são só os pés, já só podemos ver a cara e as mãos postas. Ao resto do corpo está-nos vedado o acesso. Começamos então a sentir no corpo a falta do corpo e a tentar relembrar as partes que faltam. Parece que nem recordamos, tanta é a força que fazemos para guardar todos os pormenores. É nessa altura, a altura em que concluímos que não conseguimos recordar a forma de todas as partes do corpo, que começamos a fazer batota e a recordar as fotografias. É sempre mais fácil pelas fotografias.
Depois pensamos se conseguiremos tocar no frio que vem daquele corpo. No frio que sentimos se tocamos num corpo morto. Um frio que fica na memória dos lábios, como ficam os cheiros no nariz. Que conseguimos invocar, trazer até nós. Tomamos coragem e balanço para dar um último beijo.
Não. Adiamos mais uma vez.
Questionamos se o corpo está mais leve assim. Se é mesmo verdade que acaba tudo. Se nos esquecemos de desligar o esquentador. Se ainda falta muito.
7 comments:
lá está aquela estranha forma de nos ouvirmos no outro...
isto decorre de um momento passado já com algum tempo, certo?
É. Mas só saíu agora.
Ok. Precisava que me tranquilizasses, e foi o que acabaste de fazer.;)
;) Nem me ocorreu que te podia preocupar. Mas tu percebeste logo, foi só um bichinho que deixou a dúvida. ;) Tudo sereno.
vénia, menina-alice.
*
arrepiante, muito belo e arrepiante.
questionamos tantas coisas... que a morte é talvez a única coisa verdadeiramente definitiva
bjo, Alice
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