May 11, 2006

quando for grande...

quero estar na sombra de uma arcada, na frente uma mesinha de madeira envelhecida e uma cadeira ou um banco, a escrever cartas de amor por encomenda. Quero ver os homens e as mulheres a chegar perto dessa mesinha, vergados sob peso daquela paixão, tolhidos pela saudade de momentos perpétuos, tementes das ilusões que alimentam ao deitar e ao despertar, adormecidos de sonhos do dia inteiro, pendentes do silêncio de um beijo. Olhá-los sem saberem o que pedir. Quero adivinhá-los, pressenti-los, e começar logo a escrever. A escrever num papel normal, de linhas normais, com letra normal, mas sem abreviaturas. Depois quero vê-los a reconhecerem os seus anseios naquela folha, assinarem, enveloparem, selarem, remeterem. E a esperarem.

E tenho curiculum! Quando eu tinha 13 anos, a empregada que estava em casa dos meus pais, a Sra. Maria, não sabia escrever. E a filha estava longe. Em Lisboa. Era eu que lhe escrevia as cartas. Todas as quintas-feiras. Como boa adolescente que era, tinha papel de carta bonito e envelopes a condizer e escrevia com aquelas canetas que deixavam cheiros. Ela depois foi-se embora e a filha foi a primeira mulher a conduzir autocarros na Carris.

Eu fiquei com aquela ambição profissional dentro de mim.

5 comments:

B. Dante said...

Gostei tanto.

ND said...

:)

eu penso que só pode ser coisa muita bonita, adivinhar, pressentir os outros e dar-lhes voz.
E sim, esse curriculum é obra feita! ;)
a primeira mulher a conduzir? Ena! e tu escreveste o seu nome todas as quintas-feiras!

margarete said...

:):):):):)

bookworm said...

que bela ambição, menina-alice. :)

Anonymous said...

adorei... é que adorei mesmo, tá lindo e muito bem escrito, conseguiste fazer com que me abstraisse de tudo á minha volta, só para poder saber aquilo que ias escrever na palavra a seguir...muito fixxe sister