No que à greve diz respeito, tenho vivido como o que suponho perfazer uma fatia generosa dos católicos: sou grevista não-praticante. E o que faz uma grevista não-praticante? Basicamente não faz nada, porque trabalha e porque pertence a um tipo de trabalhador que, se não trabalhar um dia, nada traz de mau ao mundo, uma peça da engrenagem, mas das pequeninas, daquelas muito fininhas que funcionam em conjunto com outras, importantes para que o sistema (teoricamente) funcione perfeitamente, mas não para que se mantenha em funcionamento. Num dia, parar ou ficar, vai dar ao mesmo. Não sou causa de paragem de cidades, portos, hospitais ou fábricas. Não lido com muitas pendências inadiáveis ou danosas quebras de produção. Sou quase tão insignificante como a maioria de nós. Mesmo considerando o(s) conjunto(s) a que pertenço.
Mas hoje, pela primeira vez, fiz greve. Não a fiz porque, a partir de Janeiro, me vão ficar com mais de um dia de vencimento. Nem para aproveitar e dar a ver ao chefe ver o que é bom para a tosse. Fi-la porque, desde há uns anos e em crescendo, na minha rotina laboral especialmente, e nas notícias do país em geral, venho notando o esforço que quem se deixa nomear para mandar, faz para não assumir as responsabilidades que são, indubitavelmente inerentes aos cargos que aceitaram. As normas, as regras e as leis, cada vez mais ininteligíveis, absurdamente longas e complexas, são o ponto de apoio de uma cultura geral de desresponsabilização e, como os exemplos vêm de cima, as chefias e dirigentes da administração pública seguem o air du temps, marcado pelo passo das figuras do Estado e do Governo, que atiram culpas para A Comunidade, para A Crise, para Os Mercados, para Os Especuladores, para A Alemanha, para A Grécia, para A Irlanda. Para O Que Calhar e nos faça esquecer actos e omissões.
Como um Estado violento que, por exemplo, professe e pratique a pena de morte, um Estado esbanjador gera cidadãos esbanjadores, um Estado que não assume os seus erros gera cidadãos irresponsáveis, um Estado que se deixa à mercê dos mais fortes com a justificação de ser tíbio, representa um país de cidadãos frouxos, sempre na disposição de terem quem cuide deles e de serem salvos à última por um qualquer super-herói ou acto divino.
Foi deste último tipo que achei que tinha de me afastar, até porque acho que tenho, mais ou menos (in)conscientemente, pertencido a esse rebanho de olhinhos arregalados, à porta do matadouro. Não que eu acredite que ter feito greve me afaste da porta do matadouro. A porta do matadouro já ficou lá para trás e a diferença que se faz ao dizer NÃO é, na prática, nenhuma. Porque tudo se passa para além do meu controlo, para além do nosso controlo e, acredito cada vez mais, do controlo seja de quem for. Já ninguém sabe da chave do matadouro.
Fazer greve hoje em dia é muito na base do not going down without a fight. Uma espécie de "A união faz a nega". Foi assim a minha.
Mas hoje, pela primeira vez, fiz greve. Não a fiz porque, a partir de Janeiro, me vão ficar com mais de um dia de vencimento. Nem para aproveitar e dar a ver ao chefe ver o que é bom para a tosse. Fi-la porque, desde há uns anos e em crescendo, na minha rotina laboral especialmente, e nas notícias do país em geral, venho notando o esforço que quem se deixa nomear para mandar, faz para não assumir as responsabilidades que são, indubitavelmente inerentes aos cargos que aceitaram. As normas, as regras e as leis, cada vez mais ininteligíveis, absurdamente longas e complexas, são o ponto de apoio de uma cultura geral de desresponsabilização e, como os exemplos vêm de cima, as chefias e dirigentes da administração pública seguem o air du temps, marcado pelo passo das figuras do Estado e do Governo, que atiram culpas para A Comunidade, para A Crise, para Os Mercados, para Os Especuladores, para A Alemanha, para A Grécia, para A Irlanda. Para O Que Calhar e nos faça esquecer actos e omissões.
Como um Estado violento que, por exemplo, professe e pratique a pena de morte, um Estado esbanjador gera cidadãos esbanjadores, um Estado que não assume os seus erros gera cidadãos irresponsáveis, um Estado que se deixa à mercê dos mais fortes com a justificação de ser tíbio, representa um país de cidadãos frouxos, sempre na disposição de terem quem cuide deles e de serem salvos à última por um qualquer super-herói ou acto divino.
Foi deste último tipo que achei que tinha de me afastar, até porque acho que tenho, mais ou menos (in)conscientemente, pertencido a esse rebanho de olhinhos arregalados, à porta do matadouro. Não que eu acredite que ter feito greve me afaste da porta do matadouro. A porta do matadouro já ficou lá para trás e a diferença que se faz ao dizer NÃO é, na prática, nenhuma. Porque tudo se passa para além do meu controlo, para além do nosso controlo e, acredito cada vez mais, do controlo seja de quem for. Já ninguém sabe da chave do matadouro.
Fazer greve hoje em dia é muito na base do not going down without a fight. Uma espécie de "A união faz a nega". Foi assim a minha.
1 comment:
não dá para eu disfarçar este misto de sorriso cúmplice com orgulho desmedido :*
Post a Comment