March 03, 2008

andar sem pisar os riscos

A igreja fica no outro lado da rua, vinte passos adiante, à entrada da praça. O cemitériozinho que a rodeia, limitado por um muro à altura de encosto, está tão recheado de campas, que as velhas pedras ao rés da terra formam um lajeado contínuo, no qual as ervas desenharam, por si mesmas, quadrados verdes regulares.

(...)

Quando da epidemia da cólera, foi preciso, para o aumentar, demolir um muro e comprar três acres de terr ao lado; mas toda essa nova área ficou quase deserta, e as campas, como outrora, continuam a amontoar-se junto da entrada. O guarda, que é ao mesmo tempo coveiro e sacristão (extraindo assim um duplo benefício dos mortos da paróquia), aproveitou o terreno vago para aí semear batatas. De ano para ano, contudo, o seu pequeno campo vai minguando, e, quando sobrevém uma epidemia, não sabe se há-de regozijar-se pelos falecimentos se afligir-se pelas sepulturas.


Madame Bovary, Gustave Flaubert

No comments: